quarta-feira, 4 de maio de 2011

Metamorfose

A palavra “metamorfose” no dicionário significa mudança, transformação. As mudanças que enfrentamos durante a nossa vida podem ser drásticas, quer para o ser humano, quer para os animais, plantas e o mundo que nos rodeia. A transformação da lagarta para a borboleta, o crescimento da criança para a fase adulta. Sim, são transformações que por muito que queiramos que não ocorram, elas acontecem e não há nada que possamos fazer. São irreversíveis.
Mas para Alice há sempre um momento em que podemos parar o tempo, e podemos ter a oportunidade de entrar num mundo dos loucos, um mundo sem responsabilidades ou preocupações. O país das maravilhas.
E se conseguíssemos voltar atrás no tempo? Seriamos a mesma pessoa que somos hoje? Claro que seria óptimo reviver os bons momentos que passámos, mas crescemos todos os dias. Evoluímos. Por vezes a mudança pode-nos tirar da nossa zona de conforto, mas o melhor de tudo é que nos torna pessoas melhores e mais fortes.
E para Alice as pequenas mudanças físicas que ocorreram tornaram-na numa criança especial, que se tinha tornado numa adulta, que nunca perderia o seu coração simples e generoso da sua infância e que ficaria sempre guardado como um tesouro as suas incríveis aventuras do país das maravilhas.
A obra começa quando Alice decide seguir um Coelho Branco que usava um colete, falava e conseguia ler as horas. No momento em que Alice cai naquela toca a sua aventura começa. A primeira metamorfose física que ocorre em Alice é quando se encontra numa sala, e que nessa sala está uma mesa de vidro com uma chave dourada em cima dela que abre uma pequenina porta para um lindo jardim. Ao desejar conseguir caber dentro da porta encontra uma garrafa com uma etiqueta a dizer “bebe-me”. Ela decide beber o conteúdo da garrafa mas repara que está a diminuir rapidamente de tamanho. Depois deseja novamente crescer e encontra um bolo com a palavra “come-me” escrita no bolo. Ela come-o e lá começa a crescer de uma forma estrondosa.
Ora, para Alice e para todos nós crescer e diminuir de tamanho num zapping é anormal. Quando comemos ou bebemos nunca teria passado pela nossa cabeça que poderíamos mudar fisicamente tão rapidamente. Sempre a subir e a descer. Deve ser muito difícil saber quem realmente afinal nós somos. Por isso Alice começa a duvidar dela própria e começa à procura da sua identidade pessoal tentando responder às três perguntas essenciais da obra: “Quem sou eu?”, “O que sou eu?” e “Como sou eu?”.
 “ - É que sabe-se lá se isto não vai acabar comigo a desaparecer completamente com uma vela - disse ela para consigo. - Que serei eu então?” (capítulo I). Neste excerto do capítulo I é a primeira vez que Alice começa a questionar-se acerca da sua identidade. A vela após ser apagada não existe nada para além do pavio apagado. E para Alice isto assusta-a porque a situação de mudar de altura é algo de novo para ela e nunca se sabe o que pode ocorrer. Ao comparar o nada com a sua altura intensifica ainda mais este processo de metamorfose.
Outro caso em que há uma metamorfose por causa da ingestão de comida ou bebida, é quando no capítulo IV Alice entra dentro da casa do Coelho Branco e encontra uma garrafa ao pé de um espelho com uma etiqueta escrita a dizer “bebe-me”. Para Alice isto já não é novidade encontrar comidas e bebidas em que não há rótulos de veneno, a não ser etiquetas com as frases imperativas “come-me” e “bebe-me”. Ela já está à espera que aconteça algo. Alice deseja crescer um bocadinho e chegar à sua estatura normal mas toma demasiado líquido e volta a crescer tremendamente.
Quando acabei de ler o segundo capítulo a primeira coisa que veio à minha cabeça foi que quando Alice bebe ela diminui de tamanho, e quando come aumenta. Porém o capítulo IV vem a contradizer tudo. Neste caso Alice bebe o líquido da garrafa e cresce, e come os pequenos bolinhos e diminui de tamanho. Cheguei à conclusão de que não são os bolos, nem o conteúdo das garrafas que decidem o destino de Alice. É a Alice que decide qual será o próximo passo a dar. Ao desejar no país das maravilhas, tudo se torna realidade.
A personagem que aparece no quinto capítulo é a Lagarta Azul, um animal que muitas vezes é comparado como o animal da metamorfose. A transformação de uma lagarta para uma belíssima borboleta. A Lagarta começa a falar com ela perguntando: “Quem és tu?” e Alice responde que já não sabe quem ela é. A Lagarta acha muito estranho não saber quem ela é e ajuda Alice a tentar procurar a sua identidade. Ordena a Alice que recite “Já és velho, Pai Guilherme”, mas como já tinha errado ao recitar “Olha o lindo crocodilo” também errou este.
O papel que a Lagarta Azul tem neste capítulo é o de mentor de Alice. Ele tenta que Alice entenda que não importa a altura que tenhamos, importa o nosso carácter e dignidade, e é isso que nos torna boas pessoas. Mesmo assim Alice não consegue chegar a essa conclusão e teve de aprender da maneira difícil: aprendendo com os seus erros. Já no capítulo VI consegue-se ver uma mudança na forma como Alice vê o país das maravilhas, e como já teve que tornar a ser mais responsável ao levar a bebé-porca da casa louca da Duquesa. Talvez por ter a sua estatura normal se sinta mais imponente em relação aos outros.
É no último capítulo quando Alice é chamada no julgamento que ela se transforma numa “borboleta”. Ela foi obrigada a mudar de altura, fazer recados a Coelhos, ter que recitar vários poemas e dizer o que uma Rainha maquiavélica quisesse ouvir mas finalmente conseguiu: tornou-se adulta.
Posso chegar à conclusão que a obra de “Alice no País das Maravilhas” não é um conto para crianças mas também pode ser utilizada na vida dos adultos. Por vezes quando crescemos nunca mais acreditamos em coisas que não existem e perdemos a fé e a imaginação. Mas para Alice isso nunca irá perder. Tal como a sua irmã mais velha diz no final, Alice continuará a ser bondosa e terá sempre o seu coração de criança, porque mesmo que queiramos apagar essa parte de nós, uma criança estará sempre na nossa mente e coração, e eu acho que é essa mensagem que Lewis Carroll tenta transmitir. Não importa as mudanças que iremos passar ao longo da vida. Importa que permanecemos verdadeiros e fiéis a quem nós realmente somos e nunca mudarmos de personalidade.

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