sábado, 27 de outubro de 2012

'Non', ou a Vã Glória de Mandar [Filme Completo]

Mensagem Um


Agostinho da Silva, Um Fernando Pessoa
 MENSAGEM UM

Àqueles a quem, não querendo mal, também especialmente não amam concedem os deuses uma vida fácil e benigna, que os faz, a eles e aos restantes, acreditar em protecção celeste; aos outros, porém, àqueles cuja carreira se vê essencial aos destinos do mundo, vendem os deuses, e bem caro, todos os dons de que os cumularam; e, porventura, o preço mais alto que reclamam de sua mercadoria é o de, a cada momento realmente importante da vida, nada disporem como que de maneira fatal, deixando que o seu amado possa, em plena liberdade, escolher o que mais é de seu agrado; e aqui a maior parte se perde: porque à chama que os tornaria celestes preferem a temperada medianidade que para sempre os prende à Terra.
Começa logo a escolha pela Pátria. Para a grande maioria dos homens, se apresenta a Pátria apenas como um acidente ou um acaso físico: são de onde nascem, e, a pouco e pouco, a convivência dos pais, de seus conterrâneos, mais tarde a Escola e o estado, os dois grandes organismos encarregados essencialmente de não deixar ninguém escapar das malhas do exército social, os vão gradual e realmente convencendo de que não poderiam ter nascido noutro lugar e de que uma escolha futura que livremente pudessem fazer representaria sempre e de qualquer modo uma diminuição ou uma traição. A outros, no entanto, e porque são amados dos deuses, se apresenta o caso de modo diferente: a vida, mostrando à superfície, como circunstância, o que é meditado e deliberado propósito de quem rege a História, os encaminha à escolha que decidirá os seus destinos: o de resplandecer num véu de glória, que é quase sempre, visto por dentro, um véu de lágrimas, ou o de ser jogado fora como um vaso de oleiro que mentiu, pela má qualidade do barro, à diligente regularidade da roda e à inventiva agilidade do gesto. Quem pode, em raro jogo, escolher o seu País por aí mesmo está escolhendo a sua vida: uma vida que dele mesmo se vai alimentar.
Para Fernando Pessoa, cuja existência se iria desenrolar, tanto quanto se poderia prever, no Portugal de seus tempos, isto é, no ponto mais baixo que poderia atingir a descendente curva da austera, apagada e vil tristeza, a alternativa apresentada foi a mais tentadora que se poderia imaginar: a da Inglaterra, e a de uma Inglaterra apreendida na sua história e na sua cultura. Por uma daquelas pequenas resoluções que movem depois as grandes molas, poderia Fernando Pessoa ter passado inteiramente ao domínio inglês e nele se afirmado como um homem de Império, já que o encontro se cumpria na África, ou como um homem de Universidade, já que o encontro era igualmente num ambiente à Walter Pater, com imaginários retratos de Inglaterra elisabeteana mascarando uma outra que apenas procurava colocar seus capitais e manter pela força os seus mercados. Numa ou noutra carreira, teria Fernando Pessoa sido célebre: as críticas a seus poemas ingleses seriam apenas o prenúncio do que outros críticos viriam a escrever; um outro Conrad, noutro domínio, se incorporaria à literatura inglesa; apenas isso, porém.
O que, no entanto, acontecia era que iam mais alto as ambições de Pessoa e penetrava a sua inteligência mais longe do que a dos estadistas ingleses. Era o mundo mais nobre, mais humano e mais divino, do que o supunha a Inglaterra e jamais se resignaria a aceitar como permanente, apesar de todas as suas excelências sobre os outros, apesar de não ter constituição escrita, apesar de tender já a uma Comunidade de nações livres, um império que, na base de tudo, mantinha as duas noções e invenções diabólicas da força e do lucro. No fim de contas, o melhor que a Inglaterra lançava sobre o universo já Portugal o fizera, muito antes dela; e Portugal porque não era de nenhuma Igreja reformada, porque se mantivera fiel a Roma e à fraternidade católica, porque nunca fora sequaz de uma ciência que tendia apenas a dominar, de uma economia que tendia apenas a explorar e de uma política que não era outra coisa senão de origem maquiavélica, deixara aberta, apesar das suas falhas, uma esperança para o futuro: a de que o seu império do mar fora apenas o primeiro passo, por isso mesmo ainda físico e político, de uma acção que depois a Europa, incompreensiva como sempre, lhe viria cortar: a de trazer para o mundo aquele Reino que milhões de homens quotidianamente imploram em vão.
Vai, pois, Fernando Pessoa, deliberadamente, confirmar o acaso físico: vai nascer português porque tem a convicção de que Deus não pode abandonar seu outro povo eleito e de que, passado o domínio da Europa, quando a técnica tiver esgotado todas as suas possibilidades, quando a economia protestante se verificar plenamente anti-humana, quando a centralização estatal se revelar estéril, Portugal virá de novo construir o seu mundo de paz, por maior que tenha de ser o seu sacrifício: mundo de uma paz que não surja como a Romana ou a Inglesa, do exterior para o interior, de um César para os seus súbditos, dos tribunais para os corpos; paz que se realize antes de tudo nas almas, lei que seja inteiramente não escrita e, no melhor de si, informulada; Reino de Deus que surja pela transformação interior do homem.
É como uma justificação e uma explicação deste seu acto fundamental de vida que Fernando Pessoa, pacientemente, vai durante quase duas dezenas de anos escrevendo Mensagem, sem dúvida a mais importante de suas obras plenamente emparelhando com Fernão Lopes, Os Lusíadas, D. João de Castro e a História do Futuro na compreensão do que verdadeiramente é Portugal; pela inteligência e entendimento fundamentais que enformam toda a obra e por ter posto mais claro do que Camões na Ilha dos Amores a concepção de um verdadeiro Império Português ou Quinto Império, veríamos até Mensagem como de importância superior à dos Lusíadas: no total, o não é, porque inutilmente procuramos na obra de Pessoa traços daquela espantosa e eloquente vitalidade de Camões, daquela ígnea personalidade que em si ardendo destruía todos os círculos limitadores que ele próprio ou os outros tentavam traçar à sua volta; a diferença que há entre Camões e Pessoa é a diferença que há entre um homem e a sua inteligência: mas esta, em Pessoa, mais clara e penetrantemente brilhava; foi mais compreensiva quanto ao Passado estático e ao Passado dinâmico, tão incisiva como a de Camões quanto ao Presente e muito mais aguda na previsão do Futuro.
A primeira ideia que nos dá Pessoa é a de que há um certo passado de Portugal que não é de natureza puramente histórica: é apenas uma revelação no passado do que é em Portugal uma perenidade; o apuramento dessa perenidade constitui o conteúdo da primeira parte do poema, aquilo a que Pessoa chamou justamente Brasão, mas que não é para ele brasão de túmulo, ou brasão daqueles palácios em ruínas que foram obsessão de Gomes Leal: o seu Brasão é a nobreza em cerne, é a essência do ser fidalgo de Portugal. Quando agir, será no Passado, a segunda parte do Poema, Mar Português, e, no Futuro, a terceira parte, O Encoberto. Brasão terá como lema Bellum sine bello: é a potência sem o acto, a energia sem a matéria, a História sem o tempo: Deus, vendo Portugal em Si eterno, escreveria Brasão. Mar Português é o acto que não esgota a potência, a matéria que não apaga a energia, o tempo que não liquida a História: por isso é apenas a Possessio Maris que o Poeta lhe deu por lema: é Portugal podendo apenas uma mínima parte do que pode; não se entregando todo e, portanto, apenas possuindo; em Mar Português, Portugal Tem, não É. Em O Encoberto, porém, toda a sua grandeza se revela: e o descerramento desta sua glória é quase a renovação, agora de homens para homens, do clamor antigo dos anjos, quando o Céu fez, por uma Terra que deles se desaviera, o sacrifício supremo de si próprio: Pax in excelsis; paz nas alturas em que o homem, indo além de si mesmo, se faz Santo; não a paz em que o homem, rendendo-se, organiza, explora e defende sua própria baixeza.
Em Brasão, Portugal é o rosto com que a Europa fita um Ocidente que, ao plenamente ser, justificará todo o passado de miséria que a humanidade tiver atravessado; a missão de Portugal não poderá ser outra senão a de resgatar o que a Europa fez e de a salvar a seus próprios olhos; por isso o seu campo, o dos Castelos, é o que serve de base ao das Quinas, o das Chagas de Cristo, este o campo próprio de Portugal: é expirando na cruz, esgotando-se no seu sangue e na sua piedade, que Portugal poderá salvar o mundo. No dos Castelos, porém, Portugal porá, como seu alicerce, o que de mais fundamental a Europa poderá ter dado ao mundo: com Ulisses, a ideia de que o mito é mais importante do que a realidade, de que o poder vir a ser é o substracto do que é, de que as coisas morrem à medida que são; com Viriato, a de que a verdadeira força propulsora da vida não é a inteligência, mas a reminiscência, e de que o ponto criador não é a definição, mas o pressentimento; com o Conde D. Henrique a de que a acção, se Deus é o agente, se faz para além das intenções e das possibilidades do herói, consistindo o heroísmo apenas em não se recusar o que não se compreende; com D. Tareja, juntamente com a da contemporaneidade do temporal e do eterno, a de que o dever perante a obra consiste em a ela se dedicar com a bruta e natural certeza com que a mãe amamenta a seu filho; com D. Afonso Henriques, a de que, para se vencerem infiéis, só vale uma indefinível arma, que, espinosianamente, tenha como um dos aspectos o da espada e como outro o da bênção, como um, o do corpo, como outro, o do espírito; com D. Dinis, a de que a intuição poética vale mais do que o plano; com o sétimo castelo, o que junta D. João e D. Filipa, o que se afirma é que a História, ao ser, toma dois aspectos: o do homem e o da obra, sendo as modificações de qualquer desses o reflexo das modificações do outro; e ainda, que o milagre da concepção humana consiste em que cada filho, sendo de seus pais, não tem ao mesmo tempo nada que ver com eles: a cada nova geração reafirma o Espírito Santo a liberdade de criar. A Europa em que Portugal assenta não é, felizmente, a Europa cartesiana.
Se a força de alicerce de Portugal vem de ter afirmado a sua existência de uma Europa que duas vezes se perdeu de si própria, primeiro na Idade Média grega, depois na Idade Média Ocidental, a sua força de salvação virá de, voluntariamente, ter incluído em seu brasão as chagas de Cristo, não pintando-as apenas, mas consubstanciando-as em gente sua: primeiro em D. Duarte, o mártir do dever; depois em D. Fernando, o mártir da grandeza de alma, superior sempre a seu destino; e em D. Pedro, o mártir da fidelidade a uma ideia claramente pensada e claramente sentida; e em D. João, o mártir de não querer senão o todo, ou o seu nada; e, finalmente, em D. Sebastião, o mártir do sonho de grandeza que está para além das circunstâncias históricas. Coroando os campos, a santidade activa de Nuno Álvares, a sua pureza guerreira, o halo que no céu gravam suas acções terrestres; e, numa afirmação final da energia que a tudo subestá, o Grifo com sua cabeça de águia adivinhando o mundo como um perfeito globo, ou melhor, obrigando o mundo a ser o globo que pensava; com uma de suas asas rasgando o firmamento num sulco de vontade, com a outra das asas o rasgando num sulco de poder.
Sobre a base teórica de que a vontade de Deus desperta o sonho do homem e de que o sonho do homem provoca o surgimento da obra, e afastando por aí, para explicar a História, tudo o que sejam causas espirituais ou materiais limitadas ao círculo humano, e pondo nitidamente, logo no primeiro poema, que a história que vai contar, a da Possessio Maris, não é a História de Portugal, mas apenas o seu interrompido prólogo, Pessoa dá o que foi o encantamento máximo dos navegadores, o de transformar o abstracto em concreto; o que foi basilar em sua actividade, a convicção de que só em Deus, como último porto de repouso; a vontade de um Rei de carácter sacramental que, faz, ao mais humilde dos homens, poder mais do que todos os medos do mundo; a glória de ter mostrado que o mar é sempre o mesmo e que a sua posse nada significa de vital; o sentimento de que o que vale na empresa de buscar é a busca e não o encontro; o mérito de ter sido o corpo da vontade de Deus, de ter sido o Tempo da Eternidade a revelar; o impulso que irá conduzir a história para além dos que o lançaram; a consciência de se ter realizado, no mundo físico, e sem nisso estar verdadeiramente empenhado, a mais alta façanha de que os homens se podem orgulhar; o ter ensinado que toda a descoberta se faz apenas quando se tem a coragem de passar além dos domínios da alegria e da dor; por fim, em Última Nau e Prece, a certeza de que, embora tenha vindo a noite e seja vil a alma, Deus ainda reserva para o seu povo Distância a conquistar.
É essa Distância como distante, é essa conquista como inconquistável o que, em O Encoberto, se anuncia pelos Símbolos, pelos Avisos, o último dos quais é o do próprio Fernando Pessoa, e se afirma triunfantemente através do negrume dos Tempos. Portugal, completando a sua obra, dará ao mundo o seu íntimo Império feito de anseios, de lonjuras, de Reinos ilocalizáveis em tempo ou espaço, o seu reino de alma humana continuamente sendo e continuamente ansiosa de mais ser, tendo-se inteiramente desprendido das ilusões de uma afirmação puramente pessoal e de uma pessoal felicidade; o mar bate nas costas do Império, mas, se o escutarmos, pára; decerto, porém, um dia, desistindo do nos opormos ao mundo, não mais o quereremos escutar; então, através de todo o nevoeiro, pelo próprio nevoeiro, terá surgido a Hora; o Encoberto, em milagre supremo, se descobrirá.


Mensagem Dois

Sem se mexer, nem sequer por dentro, como dele dizia Álvaro de Campos, Fernando Pessoa agudamente se observa a si mesmo e ao grupinho que com ele tinham formado os três poetas. Era o conjunto de mais penetrante inteligência, de maior capacidade de ironia, de menor provincianismo que jamais se constituía em Portugal; no entanto, tendo tão superiormente ultrapassado a vida, podendo, por exemplo, dizer a um Sá-Carneiro que o não achavam completamente civilizado, podendo tratar a sociedade portuguesa do tempo com o desembaraço, o desdém e a agressividade com que a trataram – apenas, de onde a onde, com algumas ingenuidades, como a de propor Mensagem a políticos cuja característica essencial era a de não serem nem imperiais, nem proféticos, nem épicos mas chapadamente pedestres, retrógrados, locais – o certo era que afinal o meio ambiente acabava por os vencer, com as bebidas, o fumo e os cafés de Fernando Pessoa, o exílio sem glória de Ricardo Reis, a morte prematura de Alberto Caeiro, e é fora de dúvida ser a tuberculose uma doença de ambiente, e o cansaço permanente de um Álvaro de Campos. O que os abatia e afinal os unia num mesmo denominador era essa falta de uma energia que todos louvaram e todos punham como o bem mais desejável de todos os bens, mas que apenas lhe dava para escreverem seus panfletos de várias formas e os comentarem ou comentarem os dos outros à volta das mesas do Martinho.
O grito de ter vindo a noite e de ser vil a alma era afinal o grito de todos, mas nenhum tinha a coragem prática de agir. Era como se o acontecimento histórico que emasculara a Nação os tivesse emasculado também a eles; era como se a Europa socrática e renascentista, vingando-se de todo o desprezo cultural e político a que sempre Portugal a tinha votado; vingando-se daquele soberbo desdém que Fernando Pessoa melhor que qualquer outro exprimira em Mensagem, o desdém pelo estrangeiro que apenas achara o que no encontrar português só por destino não fora achado; vingando-se daquela autonomia religiosa que construiria a Trindade vivida de Santa Maria, o Menino Jesus e o Espírito Santo, em oposição a uma teologia pensada que tanto conservara de judeus, gregos e romanos; era como se ela, entrando na Península pela mão de Carlos V e com o caminho preparado para erros anteriores, tivesse dado o golpe fundamental para acabar de vez com os homens que jamais desprendiam suas mãos do leme ou que tendo na mão a pena somente a manejavam nos repousos da espada ou conservavam debaixo dos buréis os arneses vestidos. E tão separados tinham para sempre ficado os portugueses de seus antepassados que, mesmo quando um acaso interno os lançava aos antigos caminhos, não mais os conheciam: Fernando Pessoa estivera em África e a África se mascarara de Inglaterra; Álvaro de Campos estivera no Oriente e o seu Oriente fora Port Said e não Ormuz, fora um conde francês e não um Fernão Mendes; Alberto Caeiro estivera no Ribatejo e o seu Ribatejo nunca fora o de Giraldo nem o de Alfarrobeira; e Ricardo Reis, partindo para o Brasil, não soubera encontrá-lo.
O poder de esmagar de tal forma o que fora a Nação mais original do Ocidente e a de mais larga e profunda missão em todo o mundo só poderia ter sido dado à Europa por um grande acerto ou por uma grande tentação; para Fernando Pessoa a ideia de grande acerto não poderia existir, poruqe detestava a América do Norte e a Rússia e não podia deixar de vê-las como o perfeito fruto da mentalidade europeia; tinha por conseguinte de se voltar para a ideia de uma tentação diabólica, mais temível do que a de quedas anteriores, e de que a humanidade só possivelmente se veria redimida por um novo sacrifício, provavelmente pelo sacrifício de Portugal como nação. Essa tentação não podia ter deixado de ser a da eficiência, e a da eficiência vista não como serviço prestado aos outros, mas como uma afirmação da própria superioridade: como da outra vez, o Diabo pegara o pecador pelo Orgulho. E passava de coincidência interessante a necessidade lógica que, tendo o palco da nova tentação e da nova queda sido a Alemanha, fosse exactamente Carlos V quem tivesse vindo emascular a Espanha e Portugal; mais a este, como inimigo fundamental porque afinal Castela sempre tivera suas pretensões a Prússia da Península.
O golpe essencial a favor da eficiência tinha sido o de ver a sociedade como uma máquina de produção, em que cada qual tem de ocupar o seu lugar e de se desempenhar de suas tarefas com o máximo de obediência a uma organização central; para que isso se conseguisse tinham-se apurado as instituições estatais, eclesiásticas e escolares pondo-as, no máximo que era possível, ao serviço dos produtores. De todas elas, as que porventura tinham custado maior mal eram exactamente as escolares, porque a sua missão consistia em fazer durar o menos possível a criança, de modo a ter, para produzir, um maior número de adultos: é por isso que é inteiramente errado dizer-se  que, na época de sua revolução industrial tinha a Inglaterra no serviço das minas crianças de cinco anos; o que ela tinha trabalhando era uma coisa muito mais monstruosa: eram adultos de cinco anos de idade.
De então para diante em nada mais se mudou, na grande massa da educação, senão nas técnicas de fabricar adultos pelo assassínio das crianças; a humanidade de jeito ocidental pratica em grande escala o infanticídio do espírito, apenas o punindo quando é físico porque isso lhe rouba definitivamente a matéria-prima do adulto. Aquelas crianças que várias vezes Fernando Pessoa apontou como a melhor coisa que há no mundo, aquele Menino eternamente criança e humano que era Alberto Caeiro o Deus verdadeiro e supremo que faltava no universo, a essas diariamente as sacrificam nas nossas escolas, diariamente as crucificam, diariamente as imolam nas aras da Eficiência. O que permitiu à Europa dominar Portugal, chegando ao extremo de lhe apresentar o que há de mais estrangeiro, de mais alheio à índole nacional, como inteiramente nacionalista, foi o pecado de ter levantado como valores supremos de vida humana os do adulto, o saber, o trabalho e aquela separação de sujeito-objecto que permite a filosofia, a ciência e a técnica. A Europa se vendeu ao Diabo e o dinheiro que nisso ganhou lhe serviu para comprar Portugal.
E, comprando-o, destruiu o último refúgio que ainda poderia haver no mundo para as qualidades distintivamente humanas, as da imaginação, em vez do saber, do jogo, em vez do trabalho, da totalidade, em vez da separação; são essas e não as outras as que têm demonstrado os grandes criadores de ciência, os grandes artistas, ou os grandes políticos: por isso os perseguimos quando vivos e os aproveitamos, porque já eficientes, quando seguramente mortos. Não haverá salvação para o mundo enquanto não entendermos e fizermos penetrar me nossas consciências este facto basilar, e enquanto as nossas escolas, transformando-se inteiramente, não forem, em lugar de máquinas de fabricar adultos, viveiros de conservar crianças; enquanto não forem as crianças que nos levem, não pelo caminho que uma ciência fáustica previu, mas pelo que houver, dando a mão, ao mesmo tempo, a nós e às coisas: enquanto não for o Menino Jesus nosso Deus verdadeiro.
É evidente, no entanto, que a escola é apenas um dos elementos de um sistema; a pedagogia está ligada à sociologia, à economia e à teologia racionais por laços muito mais íntimos do que se pensa; tudo são fabricações de adultos. Pensam eles, os pobres, que pode jamais haver no mundo alguma forma satisfatória de governo organizado, de economia organizada ou de discurso do sobrenatural, a não ser que os pensemos sempre dentro de um mundo de adultos: fora dele, num universo de qualidades infantis, num Paraíso, e é por isso, porque os adultos aí eram crianças que não havia crianças como Adão e Eva, e só as houve depois que, para podermos comer e se vestir, principiaram eles a ser adultos, - num Paraíso, todo o governo que não for amar será absurdo, toda a economia que não for colher será absurda, toda a teologia que não for contemplar será absurda.
Poderia parecer que por este caminho se poderia Fernando Pessoa opor a todo o crescimento da técnica; mas é técnico Álvaro de Campos nos melhores momentos de si próprio e, se não exerce a sua profissão, é decerto pelos seus arrebatos melancólicos, mas também porque se não percebe um engenheiro naval num País que não mais constrói navios – embora possa, como a Holanda, fabricar paquetes ou cargueiros: e o grupinho de Pessoa sabe perfeitamente através dele que é exactamente pela técnica, mas pela técnica tomada como um jogo geral e não como um meio individual de ganhar dinheiro ou poder, que pode o homem abrir o seu caminho de regresso ao Paraíso: mas, para tomar a técnica como um jogo, é preciso que se seja anteriormente criança: a conversão religiosa ao Menino Jesus deve preceder a revolução social. O contrário seria materialismo, coisa de padres sem religião, como dizia Alberto Caeiro; o que também se poderia afirmar da religião que avassalou Portugal a partir do século XVI.
Ligando os pecados da Europa ao que foi Portugal antes de a noite vir, poder-se-ia pensar que o D. Sebastião da Mensagem, o Encoberto, o que há-de voltar na manhã de mais cerrado nevoeiro, quando toda a esperança parecer perdida, é ao mesmo tempo o Menino que jamais se resignou a ser adulto no Rei de Alcácer e o Menino que jamais se resignou a ser adulto nos melhores homens do mundo; a grandeza qual a Sorte a não dá seria, não a grandeza deste mundo em que logo se pensa, mas a grandeza do Reino que Jesus afirmava ser o seu e que seria povoado dos pequeninos que a si chamava e que apontava como modelo a seus discípulos; e à volta de D. Sebastião, iniciando no mundo o novo Império, cada homem e cada mulher, redimindo-se de ser adultos, iria oferecer a um Deus também Menino, libertado finalmente de sua Cruz e de seu distante Céu, o seu ramo infantil de contempladas flores.
É por esse Império, que nem ele nem os e seus companheiros têm a coragem ou a força ou a hora de construir, porque numa história movida por Deus tudo vem a ser o mesmo; é por esse Império, que não tem lugar marcado nos mapas porque vive no sorriso, no olhar, nos sonhos dos meninos; é por esse Império, que se tornará consciente ou inconsciente a nós, como se torna consciente ou inconsciente a uma criança o que, dormindo, a faz sorrir; é por esse Império, que só poderá surgir quando Portugal, sacrificando-se como Nação, apenas for um dos elementos de uma comunidade de língua portuguesa; é por esse Império, que já foi aurora de realidade e que hoje é apenas cavo passo que se escuta em palácios desertos, que Fernando Pessoa pensa, escreve, concebe génios, sofre recolhido e ignorado morre. Mas sobre ele reina, como já reinou sobre nós outros, aquele Menino Imperador que, em oposição ao Imperador germânico, o Imperador dos adultos, e iniciando seu Império pela abertura das prisões e pela abundância para os pobres, coroavam, por amor do Futuro, os portugueses do melhor tempo; e que ainda hoje coroam os homens de Santa Catarina, entre os quais vivo e escrevo: aqui, também, esperemos, por amor do Futuro.    

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Actéon


«Haverá visão mais louca do que a que se oferece, por entre as folhagens afastadas, aos olhos de Actéon?
Sonhará ele de modo tão intenso em pleno meio-dia, ao som da trompa? Terá sido o acaso ou o tacteante desejo que conduziu os seus passos na via da salvação, para o seio da maldição? Terá ele acreditado verdadeiramente que a virgem, na sua inalcançável divindade, era alcançável? Teria sido ele quem dava a esta teofania as suas formas? Seria ele o exegeta? Ter-se-ia oferecido Artemisa aos escultores, se Actéon não se tivesse aproximado dela? Seria uma cilada da sua imaginação venatória que ele desejava armar ao seu génio tutelar? Mas que ideia querer surpreender o princípio fundador da sua vocação, para o pôr em causa! E será necessário ser-se tão louco para supor que a divindade vai descansar, despir-se e alegrar-se na água? E acreditar que ela se aborrece, e que esse aborrecimento tão raro, que vos proporcionará um divertimento exclusivo e vos encherá de um privilégio que colhereis como uma baga selvagem?
Estaria Actéon farto da caça? Adivinharia um sentido mais profundo da sua inutilidade? Numa palavra: deixar a presa pela sua sombra, não é o segredo de todos os caçadores, pois que os bens terrenos são a sombra dos que hão-de vir? Mas se o Reino pertence aos violentos, Actéon deu o primeiro passo na via da sabedoria quando se aproximou desse arbusto ardente que ele afastou, como o primeiro dos videntes em marcha, armados e mascarados.»

Pierre Klossowski, O Banho de Diana

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Monteverdi - L'Orfeo - Savall

Proposição do Canto I e últimas estrofes da obra


A obra começa com uma proposta feita pelo poeta, em que é feita a exposição do assunto do poema.

O poeta proclama por toda a parte a fama dos heróis lusitanos que fizeram a grande viagem de descobrimento até à Índia, a glória e as vitórias dos reis conquistadores de África e Ásia, para onde levaram a fé cristã, e por último enaltece todos aqueles que pelas suas obras valorosas mereceram a imortalidade na memória dos homens.

Nestas três primeiras estrofes do Canto I o poeta propõe-se então a cantar aos portugueses.

Mas a par dos elogios e louvores há também duras críticas a D. Sebastião nas últimas estrofes do Canto X da obra.

Nessas estrofes o poeta solicita ao rei que seja humano e que olhe para os seus súbditos e que repare e dê valor ao sofrimento que eles tiveram que suportar para conseguir engrandecer a sua nação. Pede-lhe que favoreça os portugueses impedindo o rebaixamento perante a dureza das leis e pede-lhe também que dê mais ouvidos aos homens mais experienciados e que sabem falar.

A obra termina quando o poeta tem já a voz enrouquecida de cantar a gente surda.

Relação entre as últimas estrofes da obra e primeiras estrofes do canto I


  Nas primeiras estrofes do canto I, encontramos a primeira parte da obra “Os Lusíadas”, denominada por Proposição. Aqui, o poeta, propõem-se a “cantar” os feitos do povo português, que segundo Camões tinham navegadores que arriscavam e faziam mais do que prometia a força humana.
  Na segunda estrofe deste canto, Camões diz que espalhará os feitos do povo português, “Cantando espalharei por toda a parte/ se a tanto me ajudar o engenho e a arte”.
  Na terceira estrofe, o poeta realça a nossa importância, através dos versos “Que eu cante o peito ilustre Lusitano/ A quem Neptuno e Marte obedeceram” querendo assim dizer que eramos tão grandiosos que até os Deuses nos “obedeciam”. E também através de “ Cessa tudo o que a musa antiga canta/ que outro valor mais alto se levanta” querendo dizer que se tem de calar tudo, porque agora se vai falar de Portugal.
   Nas últimas estrofes da epopeia, Camões diz que não lhe faltou nem estudo, nem experiência, nem engenho e que é raro se encontrar tais características em simultâneo.
  O poeta fala ainda dizendo que está ao serviço da pátria tanto para escrever como para combater e acrescenta que está disposto a descrever os feitos de D.Sebastião e que até “Alexandro” terá inveja dele.
   Concluindo, nas primeiras estrofes o poeta propôs-se a contar os feitos de Portugal e nas últimas estrofes este diz o que fez. Podemos interpretar estas últimas como auto-elogios em que o poeta está ciente de que o que fez foi grandioso e que só lhe falta mesmo é o louvor de D.Sebastião, a quem é dedicada a obra.
   Camões sente-se orgulhoso, ppois conseguio descrever os feitos gloriosos e que não lhe faltou nem inspiração nem acontecimentos.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Recompensa, mérito e valor


   Tanto o mérito, a recompensa e o valor só são atribuidos a quem realmente merece.
   Camões nestas estrofes reconhece estas três características aos homens das naus portuguesas.
   Os versos “ Alcançam os que são de fama amigos/ As honras imortais e graus maiores”, presentes na estrofe noventa e cinco, são uma demonstração do mérito e em simultâneo, da recompensa que lhes foi atribuido. O poeta ao referir a imortalidade transmite que estes homens jamais serão esquecidos e essa será a recompensa por todas as tempestades que ultrapassaram, mas sobretudo pelo amor que sentem pelo povo.
   Na estrofe noventa e seis atribui-lhes valor, dizendo que mesmo sem regalias são heróis. Na estrofe noventa e sete acrescenta que nunca desistem, mesmo sofrendo constantemente. N estrofe noventa e oito refere o facto importante de nunca abandonarem um companheiro e que não atuam por dinheiro mas sim pelo povo. Por último, na estrofe noventa e nove realça que serão sempre reconhecidos por direito.

domingo, 14 de outubro de 2012

Idade do Ouro, Ilha dos Amores, Perfeição

  Depois da Terra finalmente ordenada, quando passou de uma simples massa espessa e sem forma para se tornar num sitio maravilhoso, onde o mar, os lagos e os rios tomaram os seus cursos, a terra tomou as suas formas, os ventos instalaram-se cada um no seu ponto e o alto éter, puro e pacifico, onde os deuses viviam se distancio, se separou do magnifico céu, começou a Idade de Ouro.
  Uma Era tão nobre, tão maravilhosa e perfeita que o Homem não sabia o que eram regras, nunca ouvira falar em leis, castigos ou ameaças. Era um ser livre, não imaginava sequer o que era maldade. A terra dava frutos sem ser preciso trabalhá-la. Era uma Era de Amor.
  Tal retrato, tão puro e magnifico parece-nos magico tal como a Ilha dos Amores descrita por Camões. Esta ilha é, também, um sitio magico, um sitio onde homens se tornam lendas imortais. Um sitio que foi permitido aos portugueses ver e experienciar devido aos seus atos heróicos. Tal ilha era a única recompensa digna dos feitos dos portugueses na sua viagem, qualquer recompensa abaixo de imortal e divina seria menosprezar os portugueses. Na ilha tornaram-se imortais, conheceram o amor e a magia.
  Podemos então dizer que a Ilha dos Amores é um lugar de paz e harmonia, amor e perfeição, o lugar ideal... tal como a Idade de Ouro que  Ovídio descreveu, um sitio mágico ao qual o Homem perdeu o direito de ver e só uma escassa minoria têm hipótese de alcançar.

Ilha dos Amores: Actualização da Idade de Ouro

    Na obra "As Metamorfoses" de Ovídio podemos encontrar referências à Idade de Ouro. Esta era dourada  refere-se a um período em que o mundo vivia num estado de apogeu e glórias perpétuas (conhecido pela sociedade grega da altura). Era uma época onde não havia leis, castigos, medos nem guerras. Onde toda a gente vivia segura e não havia justiceiros. O ser humano nesta altura era considerado puro e imortal.
   A referência utilizada por Ovídio faz-nos lembrar a obra "Os Lusíadas" de Luís de Camões, mais especificamente o episódio da llha dos Amores. Após terem alcançado a Índia e terem sido aclamados como heróis pelos seus feitos gloriosos, os navegadores precisavam de ser recompensados. Porém, não havia objetos materiais valiosos dignos de recompensa para os heróis portugueses. Por isso, na viagem de volta a Portugal, as naus realizam uma paragem numa ilha desconhecida no meio do oceano Índico. Nessa maravilhosa ilha a deusa Vénus premeia os heróis lusitanos, com um merecido descanso e comprazeres divinos. Os marinheiros portugueses podiam encontrar todas as delícias da Natureza e as sedutoras ninfas com quem tinham liberdade  de entrar em jogos amorosos. Este prémio coloca os heróis num patamar superior aos outros seres humanos, a imortalidade. Podemos comparar estes tópicos de imortalidade e liberdade em Camões com a Idade de Ouro, pois nesses dois conceitos encontramos o homem a ser caracterizado como puro, imortal e com liberdade completa, sem leis nem castigos para os condenar. Com isto, é possível afirmar que o episódio da Ilha dos Amores é uma actualização da Idade de Ouro de Ovídio.
   Concluindo, as duas obras acima referidas não tinham somente estes aspetos em comum. Também foram escritas a criticar a sociedade em que os escritores se encontravam e possuiam mistura deliberada entre a mitologia e a realidade.    

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Idade de Ouro


Ovídio, Metamorfoses, Livro I

De formas mudadas em novos corpos leva-me o engenho a falar. Ó deuses, inspirai a minha empresa (pois vós a mudastes também), e conduzi ininterrupto o meu canto desde a origem primordial do mundo até aos meus dias.
Antes do mar e das terras e do céu, que tudo cobre, um só era o aspecto da natureza no orbe inteiro: Caos lhe chamaram. Era uma massa informe e confusa, nada a não ser um peso inerte, nela amontoando-se as sementes discordantes de coisas desconexas. Não havia ainda qualquer Titã a oferecer luz ao mundo, nem a Febe nova, crescendo, restaurava os seus cornos, nem a Terra estava então suspensa no ar que a envolvia, em equilíbrio pelo próprio peso, nem Anfitrite estendera os seus braços a toda a volta da longa margem das terras. Mas ainda que houvesse ali terra, e mar, e atmosfera, a terra era tão instável, as ondas não navegáveis, e a atmosfera sem luz. Nada conservava a sua forma, cada coisa opunha-se à outra, pois num mesmo corpo o frio guerreava o quente, o húmido lutava com o seco, o mole com o duro, o peso com a ausência de peso.
Um deus, ou a natureza já mais benigna, pôs fim à disputa. De facto, as terras separou do céu, das terras as ondas, e dividiu o céu puríssimo da atmosfera espessa. Após os ter desembaraçado e extraído da escuro massa, uniu cada um ao seu lugar, em harmoniosa paz.
O fogo, a energia imponderável do céu convexo, pôs-se a brilhar e fez para si um lugar no ponto mais alto. O que lhe é mais próximo, pelo lugar e em leveza, é o ar. A terra, mais densa que eles, arrastou partículas maiores, e o seu peso puxou-a para baixo. A água, fluindo à volta, tomou posse do último espaço e confinou o disco sólido.
Quando aquele deus, quem quer que ele fosse, assim dispôs aquela massa e a dividiu, e, dividida, organizou em partes, primeiro, aglomerou a terra, para que fosse uniforme em toda a parte com o formato de um grande círculo. Depois, ordenou que os mares se expandissem, inchassem pelos impetuosos ventos, e rodeassem as costas da terra. Juntou também as fontes e lagoas imensas e os lagos, e também os rios em declive cingiu com sinuosas margens. Destes, nos variados sítios, uns são absorvidos pela terra, outros chegam ao mar e, acolhidos pela imensidão de água mais livre, golpeiam a costa em vez de as margens. Ordenou aos campos que se dilatassem, vales se cavassem, folhas cobrissem bosques, se erguessem pedregosos montes. E tal como há duas zonas no lado direito e outras tantas no esquerdo a dividir o céu (uma quinta é a mais ardente), assim o zelo divino dividiu em igual número a massa que o céu envolvia, e outras tantas regiões traçou na terra. Destas, a do meio não pode ser habitada devido ao calor, neve funda duas cobre. Entre aquela e estas, pôs outras duas, dando um clima temperado, com chamas à mistura com frio. Por cima delas situa-se o ar, que é mais pesado que o fogo, tanto quanto o peso da água é mais leve que o peso da terra.
Ordenou que ali as névoas se assentassem, ali as nuvens e os trovões, que perturbarão as mentes dos humanos, e os ventos, que produzem coriscos junto com relâmpagos. A estes, o construtor do mundo não permitiu que tivessem o ar indistintamente. (Ainda hoje, embora cada um dirija o sopro a partir de regiões diversas, a custo são travados de estraçalharem o mundo: tal a discórdia entre irmãos.) O Euro recolheu-se junto à Aurora, ao reino dos Nabateus e à Pérsia, e às montanhas expostas aos raios da manhã; o Héspero e os litorais amornados pelo sol do entardecer situam-se vizinhos do Zéfiro; a Cítia e os sete Triões foram invadidos pelo gélido Bóreas; a região oposta a esta é encharcada por nuvens constantes e o pluvioso Austro. Sobre tudo isto colocou o éter puríssimo, desprovido de peso, livre de quaisquer resíduos impuros da terra. Mal tudo assim compartimentara com limites precisos, quando as estrelas, há muito oprimidas por uma névoa impenetrável, desataram a fervilhar por todo o céu. E para que região alguma ficasse sem os seus seres vivos, os astros e as formas de deuses ocupam o solo celeste, as ondas couberam aos reluzentes peixes para lá viverem, a terra acolheu os animais silvestres, o móvel ar as aves.
Faltava ainda um ser mais sublime que estes, mais capaz de conter uma alta inteligência, que pudesse reger os outros. Nasceu então o homem. Este, ou o fez de semente divina aquele artífice do universo, a origem do mundo melhor; ou então a terra recente, separada há pouco do alto éter, talvez ainda contivesse sementes do céu, seu parente, terra que o filho de Jápeto, misturando com água da chuva, moldou à imagem dos deuses que governam tudo. E se os outro animais, dobrados para baixo, olham o chão, conferiu ao homem uma cara virada para cima, e instruiu-o a olhar para o céu e a erguer o rosto erecto para os astros. Deste modo, o que há pouco era terra em bruto e sem forma transformou-se e assumiu formas de homens jamais vistas.
A primeira idade a surgir foi a de ouro. Sem justiceiro algum, sem leis e de livre vontade, cultivava a lealdade e a rectidão. Não havia castigos nem medo, nem palavras de ameaça gravadas no bronze afixado, nem turba de suplicantes temia o rosto do seu juiz, mas viviam seguros, sem justiceiros. Ainda o pinheiro não fora cortado das suas serranias e descera às límpidas ondas a visitar mundo estrangeiro, e os mortais não sabiam de outras costas senão as suas. Ainda não cingiam os povoados de fundos fossos a pique, e não havia trombeta direita, nem trompa curva de bronze, nem capacetes, nem espadas. Sem precisão de soldados, as gentes viviam numa ociosidade doce, livres de cuidados. A própria terra, isenta de deveres, intocada pela enxada, ferida por nenhum arado, tudo dava espontaneamente. E, contentes com o alimento criado sem ninguém o forçar, eles colhiam medronhos e morangos dos montes, e bagas de corniso e amoras presas em espinhosas silvas, e bolotas, que tinham tombado da larga árvore de Júpiter. A Primavera era eterna, e com tépidas brisas os plácidos Zéfiros acariciavam as flores nascidas sem semente. Depois, até já a terra sem ser arada produzia cereais, e o campo sem lavra empalidecia de carregadas espigas. E então, corriam rios de leite, então, rios de néctar, e loiro mel pingava do cimo da verdejante azinheira.
Depois de Saturno ser enviado para a negridão do Tártaro e o mundo ficar sob Júpiter, sucedeu a geração de prata, inferior ao ouro, mas mais valiosa que o fulvo bronze. Então, Júpiter encurtou a duração da antiga Primavera, e, através de Invernos, Verões, inconstantes Outonos e uma Primavera breve, dividiu o ano em quatro estações. Então, pela primeira vez, o ar, queimado por calor seco, ficou incandescente, o gelo pendeu, congelado pelos ventos; então, pela primeira vez, entraram em casas (as casas eram cavernas, densas moitas, ramos entrançados com cortiça); então, pela primeira vez, enterraram as sementes de Ceres em longos sulcos e os bezerros gemeram sob o peso do jugo.
Após este geração, seguiu-se-lhe a terceira, a de bronze, de índole mais feroz, mais pronta para as horrendas armas, mas ainda não criminosa. E a última é a do duro ferro. De súbito, todo acto nefando irrompe nesta idade de metal menos valioso. Fugiram o pudor, a sinceridade, a lealdade, e, no lugar destes, sucederam-se-lhes o logro, e a traição, e as insídias, e a violência, e a criminosa paixão por possuir. Velas desfraldava aos ventos (ainda nem os conhecia bem) o marinheiro, e as quilhas, que por tanto tempo estiveram nos altos montes, saltitavam em ondas desconhecidas. O prudente agrimensor marcou a terra, antes comum a todos como a luz do sol e os ares, com longos limites. E já nem apenas as searas e os alimentos devidos se exigiam ao rico solo, mas descem pelas entranhas da terra abaixo, desatam a escavar riquezas que aquela ocultara e movera para junto das sombras do Estígio, estímulos para o mal. Já o pernicioso ferro de lá surgira, e o ouro, mais pernicioso que o ferro. E surge a guerra, que luta recorrendo a ambos, e, com mão ensanguentada, brande as estrepitosas armas. Vive-se da rapina. O hóspede não está a salvo do hospedeiro, nem o sogro do genro: até a afeição entre irmãos é rara. O homem maquina a morte da esposa, esta a do marido. As aterradoras madrastas misturam amarelentos venenos. O filho, antes do tempo, inquire sobre a idade do pai. O respeito jaz vencido, e a virgem Astreia foi a última dos seres celestes a deixar as terras encharcadas de sangue.

Ovídio, Metamorfoses

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Mérito, Honra e Recompensa


Camões é um ser patriota. Ser patriota é ser alguém que ama a sua pátria, a sua nação e que se esforça por ser-lhe útil. O papel de Luís de Camões na obra dos Lusíadas é mesmo esse: servir os portugueses e louvá-los pelos seus grandes feitos históricos na época dos Descobrimentos.

Alguém que queira alcançar a fama e o sucesso nunca deverá pensar no glorioso passado dos nossos antepassados. Nunca deverá assumir que o seu sucesso seja devido aos seus antecessores porque nada cai no nosso colo, a não ser que haja trabalho árduo por parte de nós e acima de tudo, humildade.

Terá de ser merecido e para isso é necessário sofrer e lutar por aquilo em que nós acreditamos para alguma vez sermos considerados dignos de heróis.

Alguém que seja deleitado com fortunas e dinheiro, não é louvado. Os seus feitos não terão qualquer valor. Só aqueles que sofreram, que perderam um braço ou uma perna, que não deixaram de ser corrompidos pelas riquezas oferecidas e que mantem-se fiéis à sua virtude são os verdadeiros heróis.

Um herói não é aquele que roga por fama, não é aquele que se deleita com recompensas. Não. Um herói é aquele que não pede não em troca, que se mantém humilde e verdadeiro a si mesmo e luta pelo que acha ser justo e honorável.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Análise das estrofes 95 a 99, Canto VI, Lusíadas


   Nas últimas estrofes do canto VI, Camões reflecte sobre o valor da glória e das honras conquistadas com mérito dos portugueses.
   Apesar das inúmeras situações adversas que os marinheiros foram atravessando, com persistência e determinação conseguiram alcançar o seu objectivo, com muito mérito próprio.
   Camões faz uma reflexão onde o sofrimento é apresentado como meio para alcançar essas mesmas glórias, inacessíveis para aqueles que vivem conformados e sem espirito de conquista.
   Os portugueses lutaram até ao fim, as suas metas foram alcançadas com muito esforço e esperança e tudo isto honra e orgulha o povo português, pelo alcance de uma glória tão ansiada.
   Com todos estes feitos os marinheiros alcançaram a recompensa, que mais do que a chegada à India, passa pelo seu crescimento pessoal, e pelos valores que dominaram esta travessia.
   O reconhecimento vem depois do mérito que provém dos nossos valores é a finalização das nossas acções e a admiração por parte dos outros, o reconhecimento, é importante e merecido, mas aquilo que deve realmente motivar-nos é o alcance do mérito pessoal.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

MÉRITO, VALOR E RECOMPENSA

Nas estrofes finais do canto VI presenciamos as reflexões pessoais do poeta para com os portugueses e a sociedade da sua época. Os navegadores portugueses e as suas virtudes são aqui altamente enaltecidos.
As glórias e honras obtidas por mérito próprio são aqui valorizadas, após tanto esforço e trabalho árduo os portugueses prevalecem e vingam o seu objectivo. Conseguiram alcançar a virtude através da sua bravura e força de vontade eisso sim é que é merecedor de recomprensa.
Está também presente uma crítica à classe nobre dasociedade, o poeta afirma que não se é nobre por herança, riqueza ou luxúria mas sim através da batalha, enfrentando os perigos, sacrificando o seu próprio corpo e estando sujeito à perda dos seus companheiros e família. Foi isso que os portugueses que navegaram por mares perigosos conseguiram alcançar e serem por isso recompensados com imortalidade e predtígio pelos seus feitos.
Os navegadores passaram assim a ser vistos como grandes heróis e apresentados como o verdadeiro modelo de nobreza. Triunfaram com sucesso e só assim se poderiam superiorizar aos restantes homens e serem dignamente reconhceidos.

Reflexão sobre os conceitos de mérito, valor e recompensa

Para os marinheiros Lusitanos, não é pela aparência que valem os seus feitos. O verdadeiro mérito não é para aqueles que representam o acto nem para os passivos, mas sim para aqueles que experienciam o verdadeiro acontecimento e que têm a coragem de o enfrentar.
Os Homens de valor são os que trabalham, não os que mandam trabalhar, são aqueles que aguentam o sofrimento e a perda sem fugir.
Este esforço é reconhecido e daí terem sido recompensados com a ajuda de Vénus. Para tais pessoas, de nada lhes servem os bens materiais, apenas a honra e o mérito.

Canto VI, estrofes 95 a 99

Nestas estrofes da obra "Os Lusíadas", Camões fala sobre os conceitos de mérito, valor e recompensa.
Após uma viagem turbulenta e cheia de obstáculos, os navegadores portugueses chegam finalmente à India, completando assim o seu objetivo e conquistando a glória por que tanto esperavam e mereciam.

Tal como o poeta indica, eles sofreram para alcançar aquilo que queriam. Lutaram arduamente, ajudando-se uns aos outros no caminho, pelo que no fim o mérito do que obtiveram cai todo sobre eles. E, por terem tido tanto trabalho, reconhecidos pelo valor dos seus feitos e não pelos feitos dos seus antepassados, serão então recompensados. Não com dinheiro, mas com algo divino, pois é a única recompensa digna de tal conquista.

A Democracia só existe em si mesma se houver o exercício do voto pelos cidadãos.

Sem dúvida! Não tomando apenas esse como a única obrigação que o indivíduo tem perante a sociedade e direito que lhe foi atribuído após uma luta de anos pelos seus antecedentes, o voto neste momento é o único acto que permite uma oportunidade de decisão e poder, pela sua nação, aos cidadãos. No entanto, este indirecto modo da população participar nas decisões sobre a administração pública - Democracia Representativa - nem sempre é feito baseado nos ideais de uma democracia ou até mesmo feito por indivíduos aptos, tanto para eleger como para governar.

A palavra democracia à letra - demo kratia - é uma forma de governar baseada na soberania popular e na distribuição equitativa de poder, havendo igualdade entre todos os cidadãos como base. Tomando agora como a primeira forma de democracia representativa, pois é disso que se fala, Atenas no século V a.C. (aproximadamente). Tanto perante a lei como perante o poder na assembleia, utilizavam um sistema de sorteio, evitando assim que uma classe de profissionais actuassem separadamente do povo. Contudo, havia uma falha no sistema ateniense. Nem toda a gente que era sorteada tinha capacidade de tomar as melhores decisões para a sociedade.

Voltando à actualidade, pergunto-me:
Quem deve reger o estado? Todos os cidadãos ou a minoria apta para tal?

Logicamente que a segunda opção é a mais acertada, daí ter surgido então a democracia representativa como base das actuais democracias ocidentais. Teoricamente, funcionaria como a democracia ideal, cada cidadão faz-se representar por outros concidadãos que elegem directamente por maioria de votos, no entanto nada tem de perfeito ou sem defeitos, apesar de ser o melhor que se conhece, dando assim a hipótese e o dever de aperfeiçoá-lo.

Como?!

Tendo em conta o que foi dito há pouco, apenas especialistas devem reger o governo. E por que razão não estão os cidadãos aptos para tal encargo? Se numa sociedade só deve governar quem sabe, então ensine-se o povo a saber!
Educação, instrução e igualdade de oportunidades seria um bom começo. Apenas deste modo uma democracia seria perfeita.

Um pouco utópico? Talvez, embora não seja algo que se fizesse em duas, três ou quatro gerações, mas seria bom começar nesse sentido. A realidade é que o caminho da democracia tem seguido num sentido oposto ao que é proposto. Em vez dos nossos governos investirem fortemente na educação e instrução dos cidadãos, tudo têm feito para o evitar pois só estão no poder e seguros, com um povo estúpido à sua volta.

Acabo assim este discurso apresentando duas das soluções possíveis neste momento:
          a) Revolução popular do género "25 de Abril" com apoio militar, defendendo os verdadeiros valores da democracia;
         b) Prioridade obrigatória de qualquer governo - educação, saúde, paz, Pão e Habitação (no mínimo).

Outras opiniões em relação a este tipo de assunto não vou referir pois são semelhantes a muitas dos meus colegas. Como tal, não é só uma pessoa a partilhar uma opinião, e não deveria ser apenas um restrito número delas a agir, defendendo-as.
Cabe a esta e às próximas gerações a capacidade de mudança e atitude perante estas situações, começando por terem a noção de valor, respeito, e ao mesmo tempo instrução e educação.

domingo, 7 de outubro de 2012

Recompensa, mérito e valores


Depois de enfrentarem uma violeta tempestade, chega o triunfo dos portugueses, a tão esperada chegada à Índia.           
Este momento representa a capacidade de superação de inúmeros tormentos e de transposição de quaisquer obstáculos que levam à conquista de glória e imortalidade por mérito próprio. Assim sendo, Camões reflecte acerca do valor de tais honras, contemplando a atitude heróica subjacente, distinguindo-a das restantes condutas, pois só as glórias alcançadas por mérito próprio são valorizadas e somente estas poderão atingir a imortalidade como uma recompensa.  
Estas reflexões do poeta para além de enaltecerem os feitos portugueses, funcionam como uma crítica a quem procura o mérito e a glória por intriga e favor dos poderosos. A imortalidade dos feitos alcançados e sobretudo do modo como foram alcançados é por si só uma recompensa, mas apenas atingível para aqueles capazes de renunciar às honras e dinheiros fáceis e que se dispõe a vencer inúmeros perigos, como havia feito Vasco da Gama.

Para Camões, o sofrimento, a superação de perigos e de limitações pessoais, a disponibilidade para a guerra e as navegações árduas para regiões inóspitas são imprescindíveis na busca da glória. Glória essa que se torna inatingível para os que se refugiam nas honras conquistadas pelos seus antepassados, bem como aqueles que vivem no luxo e requintes supérfluos ou na inércia do comodismo. Sem barreiras pela frente, todos são heróis, por isso o esforço, a dedicação e entrega total são as principais características de um povo meritório e com valores.
A honra não pode ser senão o fruto de um esforço incondicional, que envolva sofrimento e luta constantes face às dificuldades, associados à coragem na confrontação com o perigo, configurando uma atitude virtuosa do indivíduo. Só assim será possível gerar uma honra genuína que no fundo é o início da recompensa, pois o mérito e os valores são os únicos meios de aquisição da experiência e do conhecimento.

Posto isto e concluindo que Camões tal como a maioria de nós prefere aqueles que se movem pala capacidade de luta e sofrimento, alcançando a eternidade pelos seus valores e feitos, será que os Lusíadas em nada se podem assemelhar com o mundo de hoje?

Na verdade, também hoje podemos distinguir os dois tipos de glorificação tal como Camões o fez há vários séculos.
Hoje todos somos responsáveis por honrar quem edifica algo de valor, quem luta contra adversidades e se dedica a causas nobres e não aqueles que têm um caminho cheio de facilidades pela frente. A honra tem de ser construída pela acção humana, pois são os nossos actos que mostram realmente aquilo em que acreditamos e o que realmente somos capazes de fazer, não só por nós, mas também pelos outros. 

Catarina Torrinha 

sábado, 6 de outubro de 2012

Canto VI, 95 - 99, Os Lusíadas

  Nestas estrofes do canto VI podemos notar os conceitos de valor, sofrimento, companheirismo, mérito e recompensa.
  Em cinco estofes apenas, Camões fala-nos destas cinco valiosas coisas e de como é importante que as admiremos. Começando pelos valores que cada um de nos deve ter, passando pelo sofrimento e companheirismo que tais valores às vezes implicam e acabando no mérito e recompensa, é-nos dada uma crítica há sociedade por esta se concentrar demasiado nas coisas supérfluas que para nada interessam sem ser para as aparências.
  Temos passagens como:
  "Não encostados sempre nos antigos troncos nobres dos seus antecessores" - reconhecidos pelos seus feitos e não gabando-se daquilo que os seus antepassados fizeram, lutando pelo que queriam;
  "Desprezando honras e dinheiro" - pessoas com verdadeiros valores não se interessam pelo dinheiro;
  "Sofrendo tempestades e ondas cruas (...) temperado com hum árduo sofrimento" - sofrendo para alcançarem aquilo em que acreditam, cuidam uns dos outros, ajudando-se. O companheirismo é marcado pelo sofrimento de perder os seus.
  "As honras que ele chame próprias suas; vigiando e vestindo o forjado aço" - tudo o que alcançaram pertences-lhes, lutaram para tê-lo, o mérito é todo deles.
 Devido aos seus valores e ao sofrimento pelo qual tiveram de passar, serão recompensados. Alcançaram tais feitos, tais grandiosidades que a sua recompensa terá de ser divina. Qualquer coisa abaixo disso seria menosprezar os seus feitos gloriosos. "subirá, como seve, a ilustre mando" - aqueles que se dignificam pela capacidade de luta e sofrimento alcançam a eternidade pelos seus esforços, pelo mérito e pelos valores que carregam consigo. Tais feitos e tais pessoas nunca serão esquecidos.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Recompensa, mérito e valores na obra "Os Lusíadas"

   Entre as estrofes noventa e cinco e noventa e nove, do canto VI, conseguimos encontrar as definições de "Fama" e "Glória". Estes conceitos são acompanhados por uma crítica à sociedade, como o autor faz ao longo da sua obra.
   Após todas as dificuldades que os navegadores passaram ao longo da viagem, as naus portuguesas chegam finalmente à Índia. Esta chegada simboliza o triunfo e a glória do povo português. Porém, Luís de Camões afirma que o homem só irá alcançar a verdadeira glória se desprezar as «honras e o dinheiro», «os luxos e requintes supérfluos» e vencer a vontade que este tem de as dominar. Só depois é que o indivíduo alcança a fama e a glória, ou por outras palavras, a imortalidade. O autor também exemplifica meios para atingir estas virtudes, como por exemplo: «As navegações árduas por regiões inóspitas, à custa de sofrimento».
   Concordo com o que o autor está a dizer, pois considero a fama e a glória bastante difíceis de alcançar. As pessoas que realizam feitos memoráveis só para terem dinheiro ou luxos, não merecem as suas recompensas. O que se deve fazer é exactamente o que o Luís de Camões explica, apenas aqueles que alcançam a honra, a fama e a glória  por mérito próprio é que poderão ser valorizados, através de recompensas. Porém, estas não são materiais. São recompensas que valorizam o trabalho árduo do herói e a maneira como este superou a vontade de adquirir esses bens materiais. 
   Concluo dizendo que nesta parte de "Os Lusíadas", os navegantes completaram finalmente o objectivo que tinham em mente. Mais para à frente da obra, iremos ver estes a serem compensados, no episódio da Ilha dos Amores. Esta ilha vai representar a única recompensa digna de um feito tão grandioso como descobrir o caminho marítimo à Índia.

A democracia e o exercicio de voto


A democracia é um regime do governo em que o poder de decisão política está sobre o povo. Sendo assim, conseguimos ver que este sistema aplica,o princípio da igualdade entre cidadãos, teoricamente todas as pessoas, sejam mulheres ou homens mas com mais de 18 anos, têm o direito de escolher quem querem como seus representantes de forma a que todos tenham liberdade de expressão e a oportunidade de manifestar as suas opiniões. É um regime que tem como ideais a igualdade de direitos e deveres de todos os cidadãos, ou seja, a justiça. Para que haja esta igualdade, não basta haver unicamente o direito ao voto mas sim o governo ter como prioridade máxima as pessoas e o seu bem estar.

Para mim, um sistema democrático tem como objetivo reger uma sociedade com justiça, e eu não acho que portugal seja um, pois muitas injustiças são cometidas e sem igualdade não posso classificar este pais como democratico.

Sílvia Amral

terça-feira, 2 de outubro de 2012

“A democracia existe em si mesma desde que se verifique o exercício do voto pelos cidadãos”


Democracia, conceito que tem como definição “governo do povo”, ou seja, é um sistema em que todos têm direito a ter voto nos assuntos respeitantes ao governo do país, de forma que todos tenham liberdade de expressão e a oportunidade de manifestar as suas opiniões. É um regime que tem como ideais a igualdade de direitos e deveres de todos os cidadãos, a justiça. Para que haja esta igualdade de que falo, não basta haver unicamente o direito ao voto.

A igualdade a que me refiro é a igualdade de oportunidades, que remete para o direito à educação, cuidados básicos de saúde, casa, e a todas as restantes necessidades básicas, independentemente da etnia de cada um, do sexo, do meio social, económico e cultural em que está inserido, bem como quaisquer que sejam as suas capacidades, funcionalidades ou necessidades especiais.

Para mim, um sistema democrático tem como objetivo reger uma sociedade com justiça, e eu não vejo como um país se possa intitular democrata quando os seus governantes não o dirigem respeitando a igualdade de oportunidades, de direitos e de deveres de cada cidadão.

"A democracia existem em si mesma desde que se verifique o voto pelos cidadãos'

  O direito ao voto já vem desde há muitos séculos atrás e sempre foi associado à democracia.
  Em Atenas, na antiguidade existia uma suposta democracia, no entanto, não era permitido às mulheres votarem. Então que tipo de democracia era esta? em que só uma parte da população tem direitos?
  Os tempos passaram-se e aqui estamos nós no século vinte e um, em que toda a população com idade superior a dezoito anos pode votar. Se a democracia se resumisse ao voto diríamos que eramos um povo ou um mundo democrata.
  No entanto, um dos princípios básicos da democracia é a igualdade de direitos, aquilo a que no senso comum definimos por justiça. Mas onde será que a podemos encontrar? Nos hospitais? Onde uns podem ser atendidos ou operados porque conhecem alguém influente e outros têm de esperar longos anos? Nas escolas? quando crianças não têm possibilidades para usufruir de uma refeição de um euro e meio e o estado nem isso lhes oferece? gastando vinte euros no almoço de cada deputado? Na procura de trabalho? em que se sem tem vinte anos não tens experiência e se tens quarenta és velho demais para trabalhar e novo demais para a reforma? simples perguntas levam-nos a só uma conclusão.
  A democracia somente existe na teoria, porque na prática, tal não acontece. E como podemos ver não é só de agora, porém esta tem vindo a evoluir, por isso mesmo quem sabe se daqui a cem anos , aqueles que são eleitos pelo povo, ganham respeito por quem lhes dá o suposto poder.

Cuidado com o que publicam, não somos os únicos que vêm o blog...

Como dá para ver nesta imagem, pessoas de todo o mundo andam a ver o nosso blog!

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Reflexão sobre a democracia e o voto

(O meu texto é a parte negra mas fica um pouco incompleto sem a parte laranja que é sobre o exemplo da América e o cultismo/fanatismo lá existente a um nível maior que noutros países. Se o professor quiser ler, leia, se não quiser, não leia)

   Oficialmente, a democracia está em prática em variados países. Esses governos são controlados pelos votos do cidadão, mas o que será que influencia o cidadão?
   Cada cidadão normalmente vota num dos partidos existentes de acordo com o que acredita que é o melhor para a entidade ou terreno que necessita de um novo representante/governador. A informação que faz o cidadão crer que um partido é a melhor escolha pode ser recebida de vários modos diferentes, sendo o método de divulgação mais comum e fácil de usar a comunicação social. As pessoas recebem informações e confiam na sua fonte sem a questionar. Se uma pessoa olhar para a primeira página de um jornal e ler "Novas questões acerca do bordel homossexual de Pedro Passos Coelho" de relance ou quando apenas está interessado no jogo de futebol ao lado, a pessoa vai receber a imagem errada independentemente do artigo refutar a afirmação ou não pois uma pessoa, apesar de se lembrar de factos, muitas vezes não se lembra de onde os aprendeu, ou seja, uma pessoa pode ficar com uma afirmação na cabeça e não se lembrar aonde é que a aprendeu. Um título no jornal ou um rodapé durante as notícias pode influenciar pessoas através de informações erróneas sem elas repararem. A quantidade de informação disponível hoje em dia permite que se um cidadão não gostar do que está a ver, pode mudar de canal ou website para algo que ele concorde /agrade, ou seja, se uma pessoa for ligeiramente de esquerda, pode simplesmente continuar a ver algo que concorde, bombardeando-se com informação influenciada pela esquerda até tornar-se numa fanática. Num culto, materiais de leitura e fontes de informação são manipuladas de modo que as pessoas lá dentro sejam mais facilmente manipuláveis. O que as pessoas estão a fazer a si próprias é submeter-se a um certo nível de cultismo.
   Existem países que contêm partidos que elevam o cultismo a uma arte. O maior exemplo é obviamente os Estados Unidos da América. Os três maiores exemplos do que eles fazem para transformar o cidadão num "rebanho" são muito simples... Primeiro, fulminam o povo com cantos. Parece simples e inocente mas cantos são há muito tempo utilizados por cultos e religiões. Uma pessoa, ao repetir uma frase, slogan ou canção está concentrada no que está a fazer e não consegue pensar com a claridade e lógica normal. Funciona como os cantos ou mantras na meditação para "acalmar a mente". Um bom exemplo é durante os intervalos das convenções politicas, eles forçam a audiência a repetir "U-S-A!" de modo a que eles não pensem na possibilidade de que o que o candidato disse pode ser retardado. Segundo, nos Estados Unidos da América, eles gostam de usar uma falácia chamada "Apelo ao Ridículo". Ao usar o "Apelo ao Ridículo", eles  transformam o argumento do candidato em algo que soa ridículo, mesmo que não seja. As pessoas influenciáveis nem sequer tentam ver se o ridículo é justificável ou não. De um modo simples é tornar um argumento como" O metano contribui para o aquecimento global" e transformá-lo em "Então estão a dizer que o aquecimento global é causado pela flatulência das vacas? Nunca ouvi algo tão parvo!". Por ultimo, os partidos gostam de transformar tudo em " preto e branco", "nós contra eles" ou até "bem contra o mal" assim eliminando todas as "escalas de cinzento  entre os dois extremos. Num exemplo simples, é como dizer "Não és a favor da pena de morte? Com que então queres assassinos a andar por aí livres!" ou "Vens connosco ao clube de striptease ou és homossexual?". Este hábito deles é claro quando as eleições deles acabam por ser bipartidárias, cada partido pertencendo a um extremo contrário.
   Com as técnicas de "lavagem cerebral" existentes, a democracia de hoje assemelha-se mais a um cultismo apesar do voto existir. Por isso, apesar da democracia necessitar do voto, a existência do voto por si só não cria uma democracia.

Democracia


A democracia é um regime de governo em que o poder de tomar decisões políticas cai sobre o povo, por meio de representantes eleitos. Sendo assim, conseguimos ver que este sistema aplica, teoricamente, o princípio da igualdade entre cidadãos, pois todas as pessoas com mais de 18 anos têm o direito e a responsabilidade de contribuírem com o seu voto, escolhendo o representante que acham ser mais digno da posição.

Contudo, o ato de votar não representa só por si um regime democrático, apesar de ser uma parte crucial.

O seu fim deveria ser dar voz ao povo, ouvir as suas opiniões e preocupações, mas hoje em dia isto não se verifica tanto quanto gostaríamos. Em vez disso, muitas injustiças são cometidas, e sem justiça nunca poderá haver igualdade, o que me faz duvidar se realmente vivemos numa democracia.

Acho que, apesar do objetivo da política ser atender às necessidades dos cidadãos, os representantes eleitos muitas vezes esquecem-se desse ponto tão básico, apenas se lembram dele no momento das eleições e um pouco depois, fazendo o que acham ser melhor para si mesmos e para o país, mas sem tomar em consideração as opiniões daqueles que verdadeiramente importam e que os ajudaram a chegar à posição em que se encontram atualmente.

Por isso, será isto uma democracia? Não, pelo menos enquanto as pessoas não forem a máxima prioridade do governo.

O que é realmente a democracia?!



Democracia é um regime de governo em que o poder de tomar decisões políticas está com os cidadãos, directa ou indirectamente, por meio de representantes eleitos.
Mas será que o voto por si só torna um regime numa democracia?
A democracia não pode ser exercida apenas nas celebrações históricas ou quando votamos.
 Sem dúvida que o voto é importante e confere-nos a possibilidade de escolher por quem somos representados.
Mas com a democracia surgem também novos direitos, valores que têm de ser tomados em consideração.
O que nos faz duvidar se vivemos realmente numa democracia é a falta de um valor que tem de estar na base de qualquer sociedade, a justiça!
Num regime democrático tem de vigorar a igualdade e a justiça, mas infelizmente nem sempre é o que acontece.
Para o desenvolvimento de um país, sem dúvida que é imprescindível o sucesso de áreas como a saúde ou a educação, mas sem a justiça nenhuma delas será suficiente.
Precisamos de sentir que votamos e somos representados por pessoas que procuram o melhor para o país, mas sobretudo para aqueles que o habitam, que tomem medidas proporcionais a todas as classes e que a política não seja desacreditada por falta de equidade.
A política é fascinante, um mundo onde se pode lutar por ideias, ser empreendedor e tentar ajudar directamente as pessoas.
Mas não é esta a ideia que a maioria de nós tem, desde pequenos que ouvimos a sociedade criticar a classe política, porque não sentem um equilíbrio entre aquilo que lhes é exigido e os exemplos de quem os governa.
Tudo isto descredibiliza uma democracia, quando sentimos que o esforço é só de alguns deixamos de pensar em conjunto como uma verdadeira sociedade e centramo-nos apenas em nós e naqueles que nos são mais próximos.
Começamos também nós a viver acima das possibilidades, na verdade o estado é uma empresa de todos, e é assim que deveria ser visto, é necessária uma visão de conjunto para que todos nós o preservemos em vez de o explorarmos.
Temos o exemplo de Portugal, um país democrático, com um óptimo clima, sem conflitos religiosos ou terrorismo, um país em que durante anos ouvi falar em crise, mas a forma como via toda a gente viver não me levava a dar grande valor a esta palavra.
Os portugueses viviam de créditos e o próprio estado vivia acima das suas possibilidades.
Numa democracia nós votamos em partidos ou em pessoas conforme sejam eleições legislativas ou presidenciais. Nestas ocasiões são apresentados programas eleitorais e verificamos que os mesmos nem sempre são cumpridos.
Temos de ter a capacidade e o direito à indignação, não nos podemos conformar e temos de lutar pelos nossos direitos e mostrar aqueles que não tem esperança que é possível lutar em conjunto, é importante influenciarmo-nos uns aos outros na vontade de melhorarmos o nosso país, por nós e pelas próximas gerações, que se pensarmos já devem ao estado por erros que não são deles.
Isto é justo?
Não é, mas a dívida tem de ser paga, os erros não desaparecem.
Mas à sempre a possibilidade da mudança, alterações profundas que mexam com muitas ideias que já estão enraizadas em nós, temos de olhar para o passado e aprender, para não cometermos os mesmos erros.
A figura central do estado têm de ser os cidadãos, a política tem de ter como fim as pessoas!
 Os cidadãos não se podem sentir violados nos seus direitos, tem de haver respeito por aqueles que sempre trabalharam e contribuíram com os seus impostos para mais tarde terem direito a uma reforma condigna e proporcional à sua vida laboral, o que cada vez mais está posto em causa.
Isto é democracia?
A falta de preocupação com as necessidades básicas do ser humano é incompreensível.
Tem de haver prioridades e as pessoas são a prioridade!
Foram anos em que houve imensos erros sem dúvida, algo tem de mudar, concordo. Mas não de um dia para o outro, é necessário tempo para nos restabelecermos, criarmos metas sem que isso comprometa o essencial para as pessoas.
Este não é um assunto controverso, penso que é um ponto comum na reflexão de todos os cidadãos, no entanto isso não acontece, o governo toma as suas medidas independentemente da calamidade que isso possa gerar, principalmente quando as pessoas não têm exemplos de sacrifícios dos decisores políticos.
Quando a justiça começar a funcionar em pleno e as pessoas forem responsabilizadas pelos seus actos, com alguma rapidez, para não se verificar a comum prescrição de casos que só revolta as pessoas, talvez aí possamos todos juntos lutar por uma sociedade mais justa, onde haja fiscalização e espaço para o empreendedorismo, oportunidades para novas ideias, uma sociedade em que os políticos saibam o que é a vida quotidiana e aquilo que realmente tem importância para o bem comum!
Os portugueses são conhecidos por serem bons e solidários, precisamos de sonhar, mas com consciência dos limites.
Precisamos da cultura e de alargar os horizontes e não nos cingirmos ao materialismo da vida.
É necessário sabermos o nosso valor, mesmo antes de sermos valorizados no estrangeiro, porque só com tudo isto podemos viver numa verdadeira democracia onde vigore a responsabilidade individual de cada um, a liberdade e a JUSTIÇA!