sábado, 8 de outubro de 2011

Será o acordo ortográfico algo bom?

            A língua portuguesa já existe há muitos anos, mas nunca teve as mesmas regras de pronúncia e de gramática que tem hoje. Foi uma língua que tal como todas as outras, teve uma origem e sofreu uma evolução até hoje, e provavelmente continuará a evoluir durante muitos mais anos. Apesar de tudo isto, a evolução das línguas dá-se de uma forma passiva, não porque novas regras são definidas mas sim porque as línguas evoluem por si próprias com o uso destas. Como tal, a língua não deve ser forçada a evoluir, a mudar, a ser falada e escrita de maneira diferente tal como o acordo ortográfico entre os vários países de língua portuguesa obriga. A língua portuguesa é igual na teoria, mas na prática tem as suas diferenças. A forma como se fala, se escreve e se pronuncia as diversas palavras diferencia de país para país. Aplicar desta forma um acordo para igualar a escrita e fala, não só é uma complicação em termos de “papelada” como uma complicação para a própria população. Obviamente, estes não são os únicos problemas, temos também problemas do ponto de vista económico e até de orgulho. Este acordo feito com o objectivo de simplificar a escrita tornou-se, na verdade, um problema. E antes de explicar porquê, alguns factos.
            Este acordo, já existente desde 1990, só se tornou oficial em 2009, mas só será obrigatório daqui a uns anos. Tal acordo foi criado com vários objectivos. Unir a língua entre os vários países, facilitar a escrita e até permitir uma comunicação mais fácil entre as pessoas dos vários países de língua portuguesa. Em teoria, todas estas razões soam bem e parecem uma boa “desculpa” para se implementar o acordo. Boas intenções com um resultado inesperado. Pois pergunto-me: será mesmo uma boa ideia mudar o que já está bom e tem funcionado até agora? Por vezes a mudança é boa, concordo, mas outras vezes estraga o que era seguro. Esta mudança causará e já causou alguns problemas que irão pesar mais que todas as vantagens e boas intenções juntas. Todas as vantagens têm assim um oposto que derruba o argumento a favor.
            Tentam unir a língua entre os vários países? E conseguem, mas destroem a língua com as suas várias evoluções. Isto porque em cada país que se fala português houve uma evolução que seguiu caminhos diferentes em cada local. A escrita de certas palavras, a pronúncia, e até a existência de certas palavras e expressões únicas ao país criava diferenças entre os diversos países. Destruir estas diferenças são o principal objectivo do acordo. No entanto, estas diferenças, apesar de por vezes pequenas, são na mesma parte da evolução da língua no país. Obrigar a população a escrever e até a falar de maneira diferente implica não só uma evolução brusca da língua, como também obriga as pessoas a escreverem de uma forma que não é normal para elas. Estão a destruir algo que faz parte do país e a forçar as pessoas a escreverem de uma forma que não é natural. Isto não é uma evolução da língua, é uma imposição de um acordo sobre a nossa escrita no qual ninguém teve direito a voto. O pior deste acordo é exactamente isso, estão a forçar a evolução e a obrigar-nos a aceitá-la.
            Temos assim a escrita completamente mudada. O único objectivo que faz sentido é o de facilitar a escrita, mas tal também só será fácil para os mais novos que ainda estão a aprender a escrever. O resto, tal como dito atrás, quer queiram quer não têm que se contentar. No entanto, o problema não será só a escrita. Com esta mudança até a própria pronúncia será diferente. Palavras que dependiam de certas letras para ter um determinado som, algo que era normal para a população, vêm-se agora sem tais letras. O que agora implica uma mudança na própria fala que é característica de cada país. Existem agora palavras que não podem ser distinguidas uma da outra sem contexto. Isto é algo absurdo para quem já fala esta língua há muitos anos. A língua portuguesa, apesar das suas diferenças, é compreensível entre todos os falantes de português de todo o mundo, venham de onde vierem. Todos percebem todos, e por isso a necessidade de mudar a escrita para facilitar a comunicação, é na verdade, um grande disparate.
            Ainda assim o pior insulto deste acordo é, na minha opinião, aquele que ofende Portugal. É ofensivo e irritante para os outros países, mas ainda mais para Portugal. Origem da língua portuguesa, Portugal tem que se contentar com uma mudança que não é feita a partir da nossa própria escrita, mas sim de uma escrita que se assemelha mais à do Brasil. É, por isso, um insulto que o país de onde a língua proveio tenha que ser um dos países que sofre as mudanças. Em vez de todos seguirem o nosso modelo, a “verdadeira” língua portuguesa, somos obrigados a escrever como no Brasil. Se a língua veio do nosso país e foi criada no nosso país, então o acordo não devia ser baseado na nossa escrita? A escrita de Portugal? Faz mais sentido seguir a escrita de um país que recebeu a língua de fora. É por isso um grande disparate, não só a mudança em si, como também o facto de ser uma mudança baseada na escrita de um país que recebeu a nossa própria língua. Eles aprenderam-na connosco, e não ao contrário.
            Estes problemas são a nível pessoal, contudo esta mudança também trará problemas económicos. Sendo este acordo obrigatório, então que todos os livros terão que passar a ser escritos segundo o novo acordo, o que implica modificar todos os dicionários e livros. E isso implica gastar dinheiro, e muito.
            Este acordo só tem falhas. É uma ofensa a todos os países, principalmente para o país de origem da língua, cria mais problemas do que os que resolve, complica a vida de todos, causa problemas económicos e, ainda por cima, é obrigatório. É um acordo com falhas e sem quaisquer hipóteses de funcionar, que, não só é um disparate, como também é uma imposição sobre a qual não podemos fazer nada em relação a ela. A opinião das pessoas não interessa e até vai chegar um dia em que as nossas opiniões, além de insignificantes, terão que ser reescritas.

Feito por: Ricardo Carnevale

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