domingo, 7 de outubro de 2012

Recompensa, mérito e valores


Depois de enfrentarem uma violeta tempestade, chega o triunfo dos portugueses, a tão esperada chegada à Índia.           
Este momento representa a capacidade de superação de inúmeros tormentos e de transposição de quaisquer obstáculos que levam à conquista de glória e imortalidade por mérito próprio. Assim sendo, Camões reflecte acerca do valor de tais honras, contemplando a atitude heróica subjacente, distinguindo-a das restantes condutas, pois só as glórias alcançadas por mérito próprio são valorizadas e somente estas poderão atingir a imortalidade como uma recompensa.  
Estas reflexões do poeta para além de enaltecerem os feitos portugueses, funcionam como uma crítica a quem procura o mérito e a glória por intriga e favor dos poderosos. A imortalidade dos feitos alcançados e sobretudo do modo como foram alcançados é por si só uma recompensa, mas apenas atingível para aqueles capazes de renunciar às honras e dinheiros fáceis e que se dispõe a vencer inúmeros perigos, como havia feito Vasco da Gama.

Para Camões, o sofrimento, a superação de perigos e de limitações pessoais, a disponibilidade para a guerra e as navegações árduas para regiões inóspitas são imprescindíveis na busca da glória. Glória essa que se torna inatingível para os que se refugiam nas honras conquistadas pelos seus antepassados, bem como aqueles que vivem no luxo e requintes supérfluos ou na inércia do comodismo. Sem barreiras pela frente, todos são heróis, por isso o esforço, a dedicação e entrega total são as principais características de um povo meritório e com valores.
A honra não pode ser senão o fruto de um esforço incondicional, que envolva sofrimento e luta constantes face às dificuldades, associados à coragem na confrontação com o perigo, configurando uma atitude virtuosa do indivíduo. Só assim será possível gerar uma honra genuína que no fundo é o início da recompensa, pois o mérito e os valores são os únicos meios de aquisição da experiência e do conhecimento.

Posto isto e concluindo que Camões tal como a maioria de nós prefere aqueles que se movem pala capacidade de luta e sofrimento, alcançando a eternidade pelos seus valores e feitos, será que os Lusíadas em nada se podem assemelhar com o mundo de hoje?

Na verdade, também hoje podemos distinguir os dois tipos de glorificação tal como Camões o fez há vários séculos.
Hoje todos somos responsáveis por honrar quem edifica algo de valor, quem luta contra adversidades e se dedica a causas nobres e não aqueles que têm um caminho cheio de facilidades pela frente. A honra tem de ser construída pela acção humana, pois são os nossos actos que mostram realmente aquilo em que acreditamos e o que realmente somos capazes de fazer, não só por nós, mas também pelos outros. 

Catarina Torrinha 

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