domingo, 9 de dezembro de 2012

Apresentação Oral ("A Última Nau" e "Prece")



A ÚLTIMA NAU

A última nau e Prece são poemas da segunda parte – Mar Português - onde nos é apresentado o percurso grandioso de Portugal, graças ao poder do sonho.
Os doze poemas que a constituem correspondem ao tempo da “acção épica” movida pela ânsia do desconhecido e pelo esforço heróico da luta contra o Mar – figurados em “O Mostrengo”, “Mar Português” e “A Última Nau”.
Apesar de ser o tempo de realização no final desta parte é referida a queda de Portugal e o desgosto pelo que se vive. Na verdade é o tempo em que se conquista um Império que depois se perde.


Poema:

Levando a bordo El-Rei Dom Sebastião,
E erguendo, como um nome, alto, o pendão
Do Império,
Foi-se a última nau, ao sol aziago
Erma, e entre choros de ancia e de presago
Mystério.

Não voltou mais. A que ilha indescoberta
Aportou? Volverá da sorte incerta
Que teve?
Deus guarda o corpo e a forma do futuro,
Mas Sua luz projecta-o, sonho escuro
E breve.


Ah, quanto mais ao povo a alma falta,
Mais a minh'alma atlântica se exalta
E entorna,
E em mim, num mar que não tem tempo ou 'spaço,
Vejo entre a cerração teu vulto baço
Que torna.


Não sei a hora, mas sei que há a hora,
Demore-a Deus, chame-lhe a alma embora
Mystério.
Surges ao sol em mim, e a névoa finda:
A mesma, e trazes o pendão ainda
Do Império.
           

É-nos descrito um dia infeliz, de mau agouro. "Erma" era a nau que navegava desamparada e só, enfrentando sozinha um destino adverso.

A ideia de que um mau pressentimento estava presente e que se predizia algo é central.

"Deus guarda o futuro, mas projecta-o, sonho escuro e breve"- só Deus sabe o futuro mas, como o Destino está traçado por vezes permite aos homens entrevê-lo em breves lampejos indefinidos e escuros, apenas no mistério.

Pessoa afirma que "falta a alma" pois os portugueses não têm alento, ânimo.

As duas últimas estrofes referem o regresso de D.Sebastião, que o poeta diz ser certo embora não saiba quando. E ao regressar vem ainda com a determinação de construir um império universal, não material, mas do espírito.
           
Este poema inicia-se em 1578 com a partida de D.Sebastião, entre sinais de mau presságio, para Marrocos. A nau com a sua bandeira içada nunca mais voltou e o embarque de D.Sebastião torna-se místico pelo seu desaparecimento material e comparável ao do Rei Artur, após a batalha de Camlan, para a Ilha Encantada de Avalon. Por essa razão o poeta pergunta "a que ilha indescoberta aportou?". Com o desaparecimento de D.Sebastião morre, aparentemente, o sonho de um império universal. Neste momento Fernando Pessoa, que até agora se tinha referido ao passado de Portugal, diz, num aparte, que o futuro é por vezes intuível aos homens e passa imediatamente a contar a sua visão do porvir. A Última Nau volta e trás um vulto (O Desejado) que Pessoa assemelha a D.Sebastião, que vem retomar a caminhada para o império universal- já não material, mas espiritual- que será o Quinto Império.

Quanto mais a decadência toma conta de Portugal, mais se exalta pelos exemplos do passado, o seu nacionalismo mítico enche-o num plano que não é terrestre, mas infinito e vê o vulto de D. Sebastião.

Fernando Pessoa não sabe quando será a hora mas tem a certeza que o regresso tão desejado vai acontecer, mesmo que demore. 




PRECE

É o poema de transição da 2.ª para a 3.ª parte da obra.
Faz uma descrição negativa do presente e consequente saudade do passado. Demonstração do desejo de novas conquistas. O Passado é representado pela grandeza nacional (Descobrimentos) e o Presente pela saudade do passado, daí a necessidade de recuperar o fulgor e o tom de esperança implícito no poema.


Poema:

Senhor, a noite veio e a alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silencio hostil,
O mar universal e a saudade.


Mas a chamma, que a vida em nós creou,
Se ainda há vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode erguel-a ainda.


Dá o sopro, a aragem- ou desgraça ou ancia-
Com que a chama do esforço se remoça,
E outra vez conquistemos a Distancia-
Do mar ou outra, mas que seja nossa!
           

Logo no início do poema o poeta transparece a ideia de que passou o tempo da nossa grandeza, tantos obstáculos vencemos que hoje perdemos a valia.

"a mão do vento pode erguê-la ainda"- tal como o fogo quase extinto pode ser reavivado por um sopro, a Alma Portuguesa pode ainda levantar-se. Debaixo das cinzas ainda resta alguma esperança.

A repetição de "ainda" reforça a ideia de que nada está perdido, de que a chama da esperança pode ser ateada, por acção do vento, isto é, de uma mudança de atitude.

Em consonância com o título, o sujeito poético, em tom de súplica, pede que um «sopro» divino ajude a atear a "chama do esforço", ainda que se tenha de pagar com «desgraça» ou suportar o peso da "ânsia".

"E outra vez conquistemos a Distância, do mar ou outra, mas que seja nossa!" - Independentemente da conquista, interessa “que seja nossa” para recuperar a identidade e glória passadas. O desejo de sermos de novo grandes entre as Nações vive permanentemente em Fernando Pessoa.

A quase totalidade dos poemas da Mensagem trata, até este ponto, da glorificação do esforço português que cumpriu um destino que nos levou a iniciar a grande Idade da Exploração. O poema anterior a este faz a ponte entre o eclipse/desaparecimento de Portugal, com o desaparecimento de D.Sebastião, e o tempo em que o poeta escreve. O presente poema conclui este ciclo da Mensagem fechando-o com uma invocação do poeta à intervenção divina.

O sujeito poético apresenta-nos um Portugal decadente, marcado pela indolência, pelo "silêncio hostil", pelo apego às coisas materiais, sem capacidade de sonhar ("a alma é vil"), em contraste com a "tormenta e a vontade" do passado.

 Os últimos versos deste poema fazem eco dos versos "Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez. / Senhor, falta cumprir-se Portugal!" do poema "Infante". Diz que falta cumprir-se Portugal, querendo dizer que falta cumprir-se o destino glorioso (e imaterial) da alma.

Já não temos as riquezas que dessas terras distantes trouxemos, mas ainda temos a riqueza das culturas que trouxemos para a Europa e da cultura que deixamos espalhada pelo mundo - o mais importante para uma alma que não é pequena.

O poema Prece fala da possibilidade humana de renascimento, sempre presente, ainda que a situação esteja distante dos tempos dourados.

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